Sonata para Piano nº11.

Acompanhado apenas por Mozart, imaginando-se num filme mudo percorria o caminho de volta para casa com o andar cambaleante e caretas eutrapélicas, direcionadas as personagens de sua mente. Pensava no que lhe fora cobrado e ensaiava em sua cabeça textos românticos, felizes. Não conseguia pôr as ideias em ordem. Pensava na aliança que usava no anelar direito. Eis sua inspiração!
Não há neste mundo, símbolo mais significativo ao amor que uma aliança, um laço eterno, infindo. Sem começo ou fim, como a nossa história que, antes de ser, já era! Os sonhos de construirmos juntos uma família, sermos um só para toda a vida são parte de um destino pré-formatado onde somos autores e protagonistas de nossa bela, e acidental, história de amor.
Infelizmente, ao chegar em casa, esqueceu-se de tudo que pensara no caminho, finalizou-se a sonata e caiu, já inconsciente aos pés da cama.

Psicose.

A mente fervilhava, parecia querer explodir, mostrar ao mundo a importância do sonhar. Mas ele apenas caminhava, com seus fones nos ouvidos, a música, mesmo no mais alto volume, era inaudível tamanha baderna em sua cabeça, discutia consigo mesmo, tentando organizar sua algazarra interna. Ao escutar o trompetista da praça acalmou-se um pouco, ensaiou alguns passos, equilibrou-se na ponta de um pé e girou o corpo, pousando com certo desequilíbrio, rindo-se, enquanto era observado pelas pessoas que seguiam seu caminho rotineiro. Deviam pensar que era louco.
Retomou seu caminho, despedindo-se  com um gesto teatral. Observava tudo sob uma nova ótica, as ruas, as pessoas. Duas em particular lhe chamaram a atenção, primeiro, o vendedor de flanelas, conhecido pelas sonoras gargalhadas e por, nos últimos meses, contar vantagem por "estar grávido" com sua esposa, hoje abrigava um olhar triste, vazio. "Será que algo aconteceu à criança? Ou será que foi com a esposa?". O mais triste era notar que ninguém mais percebia a tristeza incomum daquele jovem.
Sua cabeça voltara a ferver com as inúmeras possibilidades (in)imagináveis para cada rosto que fitava enquanto percorria o trajeto para o trabalho. Ao atravessar a Av. Rio Branco, rua movimentada do Centro, deparou-se com uma moradora de rua frente à estação da Carioca, usuária de entorpecentes - dizia com certeza pois segurava em sua mão direita uma cachimbo de pedra (de crack) - na mão esquerda segurava um grande paralelepípedo, olhava para ele fixamente, como se estivesse esperando respostas para suas perguntas não feitas. Mais uma vez inquietou-se com o olhar apagado e sem vida daquela mulher e pensou consigo "Não é possível que ninguém mais perceba o quanto ela está perdida", mas era possível, as pessoas que a notavam ali, sentada no chão, direcionavam a ela apenas olhares reprobatórios, cheios de asco e soberba, sentindo-se superiores em seus ternos e saltos.
Hoje Pedro não tinha pressa, caminhou tranquilamente, como se fosse a primeira vez, bateu continência ao Almirante e atravessou-o, sentindo sobre si os olhares e ouvindo gritos de "Louco!".
Em sua cabeça.

Compreensão.

- A sabedoria de um ser humano não é definida pelo quanto ele sabe, mas pelo quanto ele tem consciência de que nada sabe...

Nossa existência é permeada por métodos, normas e rotinas as quais nos submetemos para fazer parte de um contexto maior - a sociedade. Sociedade esta que execra aqueles que teimam em mostrar algo significativo, os que priorizam o sentir ao ter, os que são ricos de espírito - marginalizando os sentimentos sinceros e valorizando, cada vez mais, as atitudes e comportamentos levianos. A inversão de sentidos torna-se mais e mais evidente aos olhos daqueles que procuram manter a essência intacta - o mal é instigado, desejado e o bem, corrompido. Não levanto a bandeira do "eu sei sentir", mas tento sentir sem intervenção do ambiente externo, procuro observar tudo sob a ótica de uma criança, cujo sentir ainda não foi anestesiado pela superficialidade na qual nos encontramos imersos. Parafraseando Saint-Exupéry - o invisível é essencial aos olhos - ouso complementar - mas pode ser sentido pela alma.

Amor em primeira pessoa.

Eu amo.
Tu amas.
Me amas.
Minha ama me ama, me encanta, bacana, na cama.
Derrama.
O leite do peito.
A manha.
Amanhã.
Sem desfecho.

Fluidez.

Quem foi que disse que o poeta precisa ser triste?
E quem disse que atrás de tanta felicidade não existe tristeza?
Aliás, felicidade e tristeza são sentimentos tão relativos, às vezes me pergunto se realmente existem ou se são invenção nossa, afinal, temos esta mania insuportável de dar nome a tudo.
O que eu sinto, muitas vezes, não cabe no peito, e sinto esta necessidade absurda de extravasar. Por que nomear os sentimentos? É dezenas de vezes melhor senti-los, apenas.
Desculpa a falta de sentido, de linearidade.
Às vezes é melhor se expressar sem métodos paliativos.

Infindo.

Amor não se pede,
e quando se dá
nem sempre se recebe.
Eu tirei sorte grande
ganhei um amor pra toda vida.
Mesmo que seja apenas a minha.

Ele veio e eu não quero que vá embora.